sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Lordes

Of course, Oh love, Oh desperation,
O rage!
Ôrage!
Ó raios,
O rare,
O ray of light
light that beams, trickles and splinters
in sprockets of spirit, sprinting
down the lane, down the day
as the sun downs and dawns
endow the dowager
And gain the glory of geysers eternal

domingo, 6 de julho de 2014

120 horas em Lhassa - Parte XXVI (avec l'aide de L.L.A.)

28 horas, 06 minutos

A circulação era alta na tenda, monges entravam e saíam trazendo baldes d’água e um café da manhã para Heydar.

O monge que antes falara com Rorteu saiu de novo da tenda e murmurou algo para ele em Mongol, do qual Morsman conseguiu entender apenas algumas palavras, mas que juntas num contexto não queriam dizer muita coisa.

Rorteu então entrou na tenda e descobriu Morsman espiando por dentro dela. Vendo o grandalhão abrindo a porta de tela de repente, Morsman levou um susto e caiu pra trás.

-Diga, moleque- disse Rorteu numa voz rouca- Vai ficar muito tempo? Parece que um outro monge se machucou então vamos precisar do espaço.

Morsman hesitou- não podia simplesmente deixar Heydar para trás, e atravessar a Praça Central no meio daquela multidão era tudo, menos seguro, e nada impedia o apagão de acontecer novamente.

-Não tem nada que eu possa oferecer?

Rorteu deu uma ruidosa gargalhada, e disse então para o menino, entre soluços:

-Hic... e posso saber Hic o que você tem a oferec hic!

-Ei! posso oferecer muitas coisas!- disse Morsman indignado.- Sei, por exemplo, projetar e consertar equipamento eletrônico.

Rorteu subitamente parou de rir. Sem dizer nada, levantou-se e correu até o monge, disse uma coisa ou duas e voltou com ele. O monge, então, pronunciou em um teute no limite do compreensível:

-Você saber rádios construção?

Morsman então abriu um sorriso largo. Consertar um rádio fora um de seus primeiros orgulhos, aos 15 anos. Até então tivera dificuldades em ser aceito pelo seu pai, que desdenhava de sua aptidão para a literatura e praticamente não conversava com ele. Vasculhando o porão da casa, encontrou um rádio em estado lamentável: Várias peças espalhadas, algumas até retorcidas. Ao longo de um mês, o rádio por suas mãos progressivamente ganhou forma e ele o deu de presente de aniversário para seu pai. Desde então, nunca pifara. O pai passou à dar mais atenção à ele, convidando-o inclusive para trabalhar na companhia.
Depois da reconstrução do velho rádio abandonado, descobrira uma maneira de fazer uma bateria durar o dobro mudando apenas alguns circuitos e gastando apenas alguns centavos a mais e montara mais dois rádios à partir do nada.

-Sim, posso construir rádios.

-Você vem conosco- disse Rorteu, pegando Morsman no braço. 

120 horas em Lhassa - Parte XXV (avec l'aide de L.L.A.)

27 horas, 20 minutos

Morsman, Heydar e o estranho homem de capuz, chegam a Praça Central de Lhassa, apinhada de pessoas e barracas, deixando Morsman abismado.

-O que está acontecendo, Senhor?- Disse Morsman.

-A História está acontecendo!- Disse o homem de capuz.

Começaram a andar entre as pessoas até que foi avistado um monge vestido de dourado.

-Chembow Dong! Ainda bem que apareceu!- Disse em bukkara o pequeno monge de dourado. Morsman não falava Bukara, além de algumas poucas palavras, mas tinha certeza que Chembow Dong queria dizer  “grande selvagem” um nome muito curioso.

Levaram Heydar para uma das barracas onde os monges começaram a cuidar dele.

Do lado de fora da barraca Chembow Dong ficava parado em pé, como um soldado de terracota encapuzado. Ele era bem maior que maioria dos outros da praça e ainda falava teute, o que deixava Morsman muito curioso.

-Senhor Chembow! O senhor é teute?- Perguntou Morsman.

-Já viu algum teute chamado Chembow Dong? Vá dormir!- Disse o homem de capuz.

-Grande Selvagem, sim, é um nome que um monge bukara daria para um teute!- Disse Morsman, recebendo uma risada do homem de capuz.

-Certo, sente-se e pegue um chá, pelo visto se não te contar, não vai me deixar dormir!- Disse o homem retirando o capuz e mostrando seu rosto, devia ter entrem 55 e 60 anos, queixo grande, nariz proeminente, um rosto claramente teute, mas marcado e obviamente fruto de uma vida sofrida, também tinha a cabeça raspada tal assim como os monges.

-E como o senhor chegou no Monastério?- Perguntou Morsman ansioso.

-Não cheguei! No meio do caminho segurei uma pedra que soltou e rolei morro a baixo! Acordei horas depois no Monastério!- Dizia Rorteu ao ser interrompido.

-Foi um milagre! O Elmo te teletransportou para lá!?- Supôs inocentemente Morsman.

-Claro que não, garoto! Isso não é filme! Os monges escutaram o desmoronamento e foram ver, me acharam desacordado! Bom, como ia dizendo, eu acordei no mosteiro, mas sem memória, a pancada foi tão forte que quebrou alguma coisa aqui dentro da velha cachola! Eu acabei ficando no mosteiro e me uni a ordem em 1996, aos pouco eu fui lembrando de algumas coisas e lá por 2006 eu já lembrava de quase tudo. Mas agora estou feliz, estou numa nova vida! Rorteu Olfosam, de certa forma, morreu naquele desabamento!- Disse Rorteu.

-Mas e o Elmo, estava no mosteiro?- Perguntou Morsman.


-Já está tarde garoto! Você queria saber o quem eu era! Essa já é outra história! Vai dormir!- Disse Rorteu novamente cobrindo o rosto com o capuz. 

120 horas em Lhassa - Parte XXIV

37 horas, 31 minutos

Era a terceira reunião em menos de 48 horas. Alguns serviçais despejavam o chá fumegante de bules de jade em pequenas xícaras ornadas com gravuras em miniatura, enquanto os ministros iam um à um sentando-se nas almofadas de cetim vermelho.

-Bom, senhores. Creio que estejamos agora numa posição muito mais confortável do que hoje de manhã.

-Mas como, Vossa Santidade? Ainda são as mesmas almofadas de hoje de manhã.

A piada do Ministro da Economia Wong Sok provocou risadas gerais. Após um tempo, esta desapareceu e subsistiu um silêncio constrangedor.

-Certo, comecemos a reunião.- disse o Dalai Lama.

-Bom, senhor, de fato tudo parece estar sob controle- disse Laogan Turkveyeni- os últimos relatórios que me foram entregues mostram que apesar de alguns saques à lojas e incidentes menores, a situação parece ter se acalmado. Talvez o blecaute tenha sido mesmo benéfico.

Luvsanshara deu uma pequena risada.

-Pois não, Dogijavyn?- disse o Dalai Lama, subitamente ríspido.

-Desculpe, Vossa Santidade, mas esse comentário foi bastante engraçado. Se me permite, senhor, me dei a liberdade de coordenar uma pesquisa pela atualização de informações pós-blecaute.

Turkveyeni ficou pálido, assim como Wong Sok.

-Entre- disse Luvsanshara, e um idoso de feições túrquicas, pequeno e de passo arrastado, usando óculos maiores que a própria testa, entrou e entregou um papel à Luvsanshara.

-Vossa Santidade, esse é Ogomka, um de meus subordinados e um dos profissionais mais capazes que conheço, dono de uma memória que, se não é fotográfica, é sem dúvida melhor que isso. Ele compilou alguns dados sobre os efeitos do blecaute, que eu julgo... Interessantes.
Em uma voz clara de locutor de rádio, Luvsanshara começou à ler:

-Estima-se que no momento em que o EMP foi realmente ativado, o que deduzimos ocorreu às 5 horas da manhã de hoje, horário de Lhassa, 17 aviões comerciais que circulavam no espaço aéreo de Bukkara simplesmente caíram. Na hora seguinte, o número subiu à 60 e pouco tempo depois a maioria dos vôos que passavam pela Ásia foram suspensos. Estimamos o total de vítimas desses trágicos acidentes em cerca de 13 mil pessoas.

O queixo do Dalai Lama caíra e este tirara seus óculos e começara à limpá-los freneticamente.

-Os acidentes de trem também foram numerosos. Quatro descarrilaram logo após o início do blecaute, matando 1500 pessoas. Foi dito por pessoas entrevistadas que assim que a energia acabou, várias pessoas saíram dos trens- alguns dos quais haviam parado em pleno campo- e começaram a protestar. Houve notícias de vagões sendo ocupados por manifestantes nas linhas Qirihar-Almaty, Teerã-Ashgabat e a Yunnan Norte. A falta de energia nas regiões do leste, no momento em que as pessoas estavam indo trabalhar, determinou que estas ficassem em casa. No oeste, onde o dia já estava na metade ou quase acabando, os trabalhadores terminaram por, em muitos casos, ocupar seus locais de trabalho, como ocorreu nas Minas Dorogvan na Armênia e no estaleiro Palma de Buddha em Astrakhan. Nos Campos de purificação espiritual, a falta de energia gerou pânico e motivou levantes contra as autoridades. Em Taitogrado, os Taïteis entraram em guerra aberta contra o governo. Em suma, acredito que esse blecaute nos ameaçou como nenhum exército inimigo jamais pôde ou poderá.

O espanto na sala foi geral quando Luvsanshara encerrou seu sombrio monólogo.

-Saiam da sala.- disse o Dalai Lama com o rosto esbranquiçado, mirando com a cabeça Turkveyeni, Wong Sok, Poteng e Gangchen.

-Mas a reunião...

-Eu disse saiam!

Os quatro ministros andaram ruidosamente e espremeram-se por ela, tentando passar juntos. Apenas Luvsanshara ficou.

-Senhor- disse Luvsanshara levantando-se, olhando para Tenzin Gyatso de cima- Acredito que esse longo rapport tenha servido para demonstrar a competência do Ulukorbak.

-Com certeza- disse o Dalai Lama, encolhendo-se em sua almofada.

-É claro que gente como Rinpoche ou Wong Sok devem entender de Economia ou de Infraestrutura- mas no fim, quem é melhor para dar informações do que o Ministério da Informação e Segurança?

-De fato.

-É por isso que eu peço que contrate Ogomka como substituto temporário de Dao Rinpoche.

-Perdão?

-Veja só, Vossa Santidade. Seus antigos ministros tinham muita independência. Zheng Gyatso praticamente armou um golpe contra o senhor ao retirar a artilharia do Promontório Sereno. Dao Rinpoche agiu impulsivamente e provocou uma catástrofe que levaremos muito tempo para superar. Mas ainda temos tempo de sujar as mãos e agir onde os subalternos falharam. Dando a Ogomka o posto, você não somente estará contratando alguém de muito competente, estará também dando a sua opinião sobre como a infraestrutura do país deve ser administrada. Além do mais, eu conheço todo o Ulukorbak: sei quem é de confiança. Imagine se- não que o senhor seja capaz de tal erro- Vossa Santidade tivesse chamado o General Chimid, que até ontem ostentava a máscara de um oficial justo e respeitado por seus homens, para o posto de Ministro da Guerra.

-Eu... entendo.


-Obrigado por entender meu ponto de vista, Vossa Santidade- Luvsanshara curvou-se e beijou a mão do Dalai Lama que estava tremendo. E então saiu da sala, deixando-o ás escuras. 

120 horas em Lhassa - Parte XXIII (avec l'aide de L.L.A.)

26 horas, 39 minutos

Morsman Gunteusam do Clã Albe acabara de se formar em tecnologia da comunicação pela universidade de Teutenagari, e o que ele ganhou de seu pai? Uma viagem de mochileiro que ele sempre quis fazer. Viajar o mundo por um ano, antes de começar a trabalhar nas empresas do Clã.

Morsman tem 22 anos, 1,86m de altura. Sua aparência grandalhona e truculenta de teute contrastava com seu jeito atrapalhado e empolgado. Dotado da irritante mania de arrumar os óculos com o dedo mindinho constantemente.

Só que como nem tudo são flores, Morsman se encontrava em Bukkara, mais precisamente em Lhassa, no fatídico dia das revoltas.

O Albergue estava gritantemente vazio, já não haviam muitos turistas estrangeiros, a maioria era formada de viajantes de outras partes de Bukkara que passavam pela capital. Quando as revoltas começaram a maior parte desapareceu, restando somente Heydar, um mercador bukkara de etnia Azeris com uns 45 anos e um bigodinho aparado ridículo em forma de retângulo, que só ficara, pois como Morsman, não tinha para onde ir.

Naquele dia Heydar havia saído do albergue com o que tinha, na esperança de fazer algum dinheiro vendendo as mercadoria. A final, com toda esta confusão, deveriam estar precisando de suprimentos.

Morsman ficou em sua cama, mas o tempo passou e Heydar não voltava, Morsman resolveu sair, foi para a rua comercial mais próxima chamada Pah´Djé.

Após procurar alguns minutos, Morsman logo viu a bagunça, a rua parecia ter sido saqueada durante o apagão. Logo a frente envolto em escombros do que outrora foi uma loja, encontrava-se Heydar semi inconsciente, sem seus pertences e sangrando.

Morsman não falava muito de Bukara, além das típicas frases de turista, mas dadas as circunstâncias, seus gestos dispensavam as palavras. Com parte de sua camisa fez uma atadura para parar o sangramento e quando já estava carregando Heydar nas costas, viu um grupo de jovens Bukaras armados de paus e carregando coisas, claramente vândalos.


Morsman carregando um ferido e sozinho contra aquele grupo não tinha muita chance, quando um do grupo aponto para eles e gritou algo em um dialeto bukkara.

-Não vão te pegar, Heydar!- Disse Morsman pegando um pedaço de pau com pregos que estava no chão.

O grupo disparou para cima de Morsman que se colocava a frente de Heydar que já mais consciente gritava algo que Morsman não entendia. O grupo devia ser formado por 7 a 8 Bukkaras de uns 17 anos, que apesar de terem quase um metro e meio, não davam muita chance a Morsman dada a proporção numérica.

O Primeiro chega e Morsman o acerta com o pau que com os pregos, fica cravado no bukkara que cai ao chão inconsciente, os outros recuam e entram numa loja. Morsman com o coração em disparada pega Heydar julgando ser essa a chance de escapar, quando olha para trás e vê o grupo voltar armado com facas e um que parecia ter um revolver.

-Quer Saber Heydar? Linha 7 do Bukarta : “Perder uma batalha para ganhar uma guerra não é uma derrota.” Pernas pra que te quero!- Disse Morsman saindo em disparada carregando Heydar sobre os ombros como um saco de café.

Morsman escuta um zumbido passar perto de sua orelha, claramente um tiro. Seu coração acelera, seu corpo gela. Morsman não era um atleta, já começara a sentir o cansaço de correr carregando um homem adulto por três quarteirões, ate que ao virar a esquina dá de cara com um homem encapuzado vestido de amarelo, sendo que não era possível ver seu rosto.

-Fique quieto rapaz! Deixe eu fazer o que sei fazer de melhor! E o que eu sei fazer de melhor, não é bonito!- Disse o homem encapuzado em teute, o que foi surpreendente devida a circunstâncias.

O Homem encapuzado tira de dentro de seu manto um revolver e calmamente mira e atira no vândalo que estava atirando, o qual cai ao chão como um saco de areia. Em seguida ele guarda o revolver e desembainha uma espada, os membros restantes gangue ao ver o companheiro caído morto ao chão, saem em disparada.

O homem de capuz se vira para ir embora sem dizer nada.
-Senhor! Obrigado! Por favor, este homem está muito ferido, precisamos de um médico!- Disse Morsman.

-Nem tente levá-lo aos hospitais garoto! Depois do blecaute estão todos uma bagunça! Venha comigo até a Praça Central! Venha comigo! Conheço alguns monges que podem ajudar!- Disse o homem novamente em teute.

Após andarem algum tempo, Morsman não se agüenta mais de curiosidade sobre o estranho.

-Como o senhor fala teute?- Perguntou Morsman.

-Eu aprendi!- Disse o homem secamente.

-Foi muita coincidência esbarrarmos com o senhor!- Disse Morsman feliz, tentando puxar assunto.


-Não existem coincidências, garoto!- Disse o homem do capuz.

120 horas em Lhassa - Parte XXII

26 horas, 26 minutos

O Dalai Lama acordou de um breve cochilo quando ouviu o barulho de uma mão batendo na pesada porta de cobre desgastado.
-Entre, entre, por favor.
A porta se abriu e Dao Rinpoche entrou, curvando-se e tentando andar ao mesmo tempo, o que o dava um ar meio patético.
-Vossa Santidade, a missão foi cumprida- disse em um tom de voz que beirava o respeitoso e ainda assim não chegava à sê-lo, causando um efeito estranho.
-Que ótimo. Guardas, levem ele.
Rinpoche levantou a cabeça.
-Perdão, senhor?
Nesse momento, dois guardas que estavam sentados ao lado do Dalai Lama se levantaram e agilmente agarraram Rinpoche pelos braços.
-Espere! Espere! O que está acontecendo?
-Sua incompetência quase arruinou esta grande nação, Rinpoche. Se não fosse você, o plano de mandar bombardear a praça teria sido um sucesso. É tarde para remediar, mas não para puní-lo.
-ESPERE! ESPERE! O QUE VÃO FAZER? SEU... SEU CORNO! VOCÊ NÃO PODE ME JULGAR! APENAS O KARMA JULGA!
O Dalai Lama se ergueu, e ficando sério, pronunciou, tonitruante:
-Karma? Você não entendeu nada. Eu sou o Karma, Rinpoche. pra todos os efeitos, eu sou até Buddha. Se você não entendeu isso, a resposta estará no pé dessa montanha.
-NÃÃÃÃÃÃÃÃÃO!

Rinpoche agitou-se freneticamente enquanto era arrastado pelo saguão até ser levado para um vão íngreme que se abria sobre a imensidão dos Himalaias. Os soldados, sem a menor cerimônia, jogaram o velho ministro montanha abaixo, e seu grito rasgou o silêncio imortal da montanha até ser engolido por ele. 

120 horas em Lhassa - Parte XXI

25 horas, 07 minutos

O sol mal nascera e já começara à se acovardar novamente atrás das nuvens. Vai chover, pensou Zheng Gyatso. Desde que retornara ao Promontório Sereno, ficara sentado à observar o vazio, enquanto soldados esperavam atrás dele, confusos, em desespero, perdidos na ausência de ordens. Via a cidade lá embaixo e os berros da multidão que prosseguiam. De repente, alguns postes hesitantemente começaram á exibir uma luz fraca e bruxuleante. Pouco à pouco, todos os postes da Praça foram acendendo. A energia voltara.
Gyatso checou seu celular. Imediatamente, ele começou á tocar. Era o Lama Poteng. Gyatso então teve uma sensação curiosa; tivera a impressão de ter visto a sua sobrinha- qual era o nome dela mesmo? Enfim, a garotinha que vira há dois anos em seu aniversário. Havia crescido e já era uma mulher, mas ele pôde reconhecer as suas feições. Talvez fosse algo que Poteng merecesse saber.
Atendeu o telefone.
-Alô Poteng?
-Gyatso, cadê as explosões? Vossa Santidade já disse uma dúzia de coisas não publicáveis sobre você. Ataque, ele está apressado.
-Poteng, eu vi a sua sobrinha.
-...Hein? Li?
-É, acho que sim. Ela está na Praça Central.
-Na praça?!? Puta merda.
-É. Acho melhor você ir lá e falar algo com ela.
-Caramba... Mas Gyatso, sério, assim que essa munição chegar, vá com tudo pra cima dos manifestantes! Não deixe pedra sobre pedra!
-Certo. Até logo.
Zheng Gyatso desligou o celular e continuou mais uma vez à olhar para a Praça. Um dos soldados finalmente tomou coragem e aproximou-se, cutucando-o nas costas.
-Senhor... o carregamento de munições estará aqui dentro de cinco minutos. Devemos iniciar o processo de mira?
Zheng Gyatso desgrudou-se da voz do soldado e, por um instante, teve a impressão de ouvir pássaros cantarem. Aquela região toda era muito árida e não escutava o canto de pássaros há vários anos.
Gyatso cutucou o pequeno volume que sentia no bolso.
-Não.
-Perdão?
-Faça o seguinte. Retire a artilharia do Promontório e mande-a de volta para a estação.
-O que?! Senhor, eu não entendo...
-É uma ordem. Está questionando um general?
-Não, Senhor.
-Então faça-o.
O soldado saiu rapidamente distribuindo ordens e ninguém entendeu nada, mas a artilharia logo foi sendo conduzida para fora do Promontório. Gyatso nesse meio tempo retirou o volume que estava em seu bolso: uma pequena pistola automática.
Todos os caminhos levavam à um mesmo fim. Ele escolhera o mais curto, e o único que lhe daria satisfação.
Era uma bela visão. Gyatso tentou fixá-la. A multidão irada, que continuava berrando; o mármore do chão do promontório; o cantarolar dos pássaros que mais parecia uma ilusão esquecida.
Levou a mão a cabeça.
Nada mais importava- nem o soldado que correu em sua direção gritando seu nome e de quem ele apenas via os calcanhares, nem o homem com quem dividia seu nome e cujos abusos ele por muito tempo suportara.
Após anos servindo a religião buddhista com mais desprezo e descrença do que fé e dedicação, ele chegara lá.

Ele chegara ao Nirvana.